segunda-feira, setembro 28, 2009

Testar o negócio do cool a partir de Lisboa

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Os cool hunters descobrem tendências que podem ser convertidas em oportunidades de negócio. A AYR Consulting, primeira e única consultora detrendsem Portugal, criada em Fevereiro, já anda a tentar convencer as empresas a adoptar ocool huntingcomo ferramenta de gestãoOscool huntersdescobrem tendências que podem ser convertidas em oportunidades de negócio. A AYR Consulting, primeira e única consultora detrendsem Portugal, criada em Fevereiro, já anda a tentar convencer as empresas a adoptar ocool huntingcomo ferramenta de gestão
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Desde que se mudou para Milão, Bruno Brazão dorme menos, observa mais, viaja com frequência e anda sempre com o Blackberry atrás para poder registar tudo o que veja de "diferente e inspirador". Esta é a rotina de umcool hunter: um caçador de tendências, um coleccionador de ideias, um profissional daquilo a que também se pode chamartrend scouting.

"Ocool huntingconsiste em reconhecer e caçar aquilo que écool. Ou seja, tudo o que é atractivo, inspirador e com potencial de crescimento", diz Luís Rasquilha, vice-presidente da AYR Consulting, a única consultora de tendências em Portugal, sediada em Lisboa e ligada a uma das maiores redes mundiais decool hunting, a Science of the Time (a Future Concept Lab e a Trend Watching são outros exemplos). Ocool huntingnão se limita à procura de coisas novas. O importante é desmascarar o comportamento das pessoas enquanto consumidores e descobrir "quais as mentalidades que estão por detrás". Traduzir essas mentalidades, "conceitos emergentes" ou tendências eminsightsde negócio é o passo seguinte. "Estesinsights, quando identificados e convertidos em mais-valias empresariais, possibilitam o desenvolvimento de novos produtos ou serviços, marcas, segmentos-alvo, novas formas de comunicação, distribuição ou planos demarketing", explica Luís Rasquilha. Ocool hunting tem como finalidade "encontrar oportunidades que possam ser aproveitadas pelas empresas" e servir de apoio à sua estratégia comercial, acrescenta.

Apesar de ocool huntingse ter estabelecido como negócio nos anos 90, as suas raízes residem, segundo Bruno Brazão, na década de 50, altura em que nasciam os primeiros observadores de tendências. "O objectivo era ajudar a indústria têxtil a ir ao encontro das novas exigências do mercado do pós-guerra", aponta Brazão. Estes profissionais dastrendseram "jornalistas de moda, pessoas muito viajadas ou indivíduos influentes na sociedade que procuravam melhorar olook e a qualidade dos produtos estandardizados. Começaram por fazer apenas pequenas sugestões baseadas em quadros de cores e alguns esboços. Com o passar do tempo, as suas recomendações tornaram-se mais elaboradas, surgindo os primeiros gabinetes especializados em tendências", recorda.

Contudo, actualmente, ocool huntingnão surge apenas vinculado à indústria da moda. Abrange todas as áreas de mercado, desde o ramo hoteleiro ao sector bancário. "Há muita gente que pensa que écool hunterporque anda atrás degadgets, de roupa, mas não de mentalidades. O que é tendência é aquilo que resiste ao tempo, que pode mudar na forma mas não na essência", sublinha Luís Rasquilha.

No Cazaquistão também

A Science of the Time - cujo fundador eCEOé Carl Rohde, reconhecidotrend watcher- conta com mais de três milcool hunters espalhados praticamente por todo o mundo. Estão nas grandes metrópoles, como Nova Iorque, Barcelona, Londres ou Paris, mas também em cidades como Buenos Aires, Santiago do Chile, Xangai ou Skopje (Macedónia), porque a estratégia da empresa é apostar nos mercados emergentes: "O Leste, excluindo a Rússia; África, exceptuando a do Sul; e toda a América Latina", enumera Rasquilha. "Não os consideramos mercados emergentes por serem subdesenvolvidos. Como são mercados novos, a abrir-se ao Ocidente, encontram-se muitas tendências e é mais fácil identificar movimentos do que em mercados mais saturados, como Nova Iorque", esclarece.

Eduardo Garcia largou uma carreira de 30 anos como publicitário para ser um dos observadores da Science of the Time e para integrar a equipa da AYR. Estava no Cazaquistão quando recebeu o convite de Carl Rohde e foi lá que ficou para iniciar a actividade decool hunter, pois "a região ainda não estava coberta", conta. A nova profissão exigia intuição e disciplina mental. "Percebi que a primeira capacidade que umcool hunterdeve ter é a observação de tudo o que nos rodeia", declara Eduardo Garcia. Há duas vertentes na abordagem: "Primeiro temos de observar as coisas não consoante os gostos pessoais, mas enquanto possíveis consumidores. Temos de ver como é que a sociedade se está a mover do ponto de vista político, social, cultural, sexual, familiar, comunicativo. Depois é preciso intuição para saber o que pode ou não ser tendência." Apesar de seguir algumas regras, o papel decool hunternão se ensina, "treina-se", avisa Luís Rasquilha. "A partir do momento em que se entra no mecanismo, estamos sempre a fotografar, a ler, a tomar notas, a recolher informação. Ocool pode ser pessoas, espaços, sons, música, cores."

Algumas das observações recolhidas pelos cool hunterssão divulgadas no Top 15 do site da Science of the Time (http://www.scienceofthetime.com). Nas categorias saúde e sociedade, vemos, por exemplo, que, nos Estados Unidos e no Reino Unido, já há festas com pessoas infectadas com o vírus H1N1. Em Istambul, a Sony deu a volta ao aborrecimento que é estar à espera do autocarro: transformou as paragens numa espécie de Playstation, cobrindo-as com embrulhos de plástico com bolhas de ar. Os passageiros vão passando o tempo morto a rebentar bolhas, que correspondem aos símbolos da consola.

O secretismo é uma das tendências identificadas pela Science of the Time que se materializa em vários sentidos. "Embora as pessoas gostem de ir para as discotecas e de confusão, muitas vezes gostam de estar em casa e conviver com pequenos grupos de amigos, num ambiente mais individualista", revela Luís Rasquilha. O conceito deu origem a séries limitadas de sapatilhas, por exemplo da Foot Locker; lojas temporárias, que funcionam durante três ou quatro meses e fecham no resto do ano (a Vida Portuguesa, de Catarina Portas, começou por estar aberta apenas nos meses de verão); ou séries assinadas de roupa para determinadas marcas, exemplifica Rasquilha. É a lógica de "tornar exclusivo sem ser elitista".

Já o facto de as pessoas quererem consumir comida saudável, mas continuarem sem tempo para comer fez nascer o conceito da good-fast-food, que tem como exemplos em Portugal as marcas Go Natural ou H3.

Ferramenta anticrise

Tal como Eduardo Garcia, Luís Rasquilha também deixou a publicidade para sercool hunter da Science of the Time, há cerca de um ano. As primeiras observações que enviou foram "completamente ao lado", mas da segunda vez "já foi melhor". "Até entrei no Top 15 em 4.º lugar", graceja.

Não demorou muito tempo para Luís Rasquilha criar o projecto da AYR Consulting, aquilo "que faltava" para converter as tendências e informação coligidas pela Science of the Time em valor acrescentado de negócio. Assim, se a Science of the Time descobre as tendências, a AYR, enquanto consultora, coloca-as em prática. Criada em Fevereiro deste ano, a AYR está sediada em Lisboa e, para Luís Rasquilha, é o sítio onde deve estar. "Convenci o Carl Rohde [CEOda Science of the Time] que Portugal estava no centro do mundo e que Lisboa era uma cidade inovadora, criativa e heterogénea", diz. O objectivo é testar o negócio docool "a partir de Lisboa para os mercados emergentes", nos quais se incluem os países lusófonos.

Segundo Luís Rasquilha, o trabalho desenvolvido pela AYR ajusta-se ao cenário económico actual. "Numa altura em que os mercados andam todos à procura de novos caminhos, muito por causa da crise, o nosso trabalho é ajudar as empresas a antecipar o futuro, os próximos movimentos e os desejos dos consumidores." Entre os clientes da AYR destacam-se a Microsoft, a Unilever e a Adidas, à escala mundial. A nível nacional, a consultora trabalha com um grupo hoteleiro, duas agências de publicidade, uma marca de roupa, associações ligadas às indústrias criativas e ao empreendedorismo e algumas universidades.

A consultora demediaUnited Media Consulting foi um dos primeiros clientes (e parceiros) portugueses da AYR. "Aderimos aocool huntingpraticamente desde o início porque percebi que podia ser uma mais-valia na relação com os clientes", afirma o administrador, João Peres Alves. Integrar a consultadoria em tendências e inovação nas empresas "ajuda ao posicionamento no mercado, ver se os produtos ou serviços continuam a ter procura e se satisfazem os clientes". No caso de isso não acontecer, é preciso perceber porquê e aí "prever os comportamentos futuros dos consumidores, área em que a AYR actua", diz João Peres Alves. Para o administrador, ocool huntingé, para além de uma ferramenta de gestão empresarial, um instrumento de modernização anticrise. "Acho que as empresas, no futuro próximo, não irão ter muitas alternativas senão adoptar o negócio docool. Num mercado aberto e com problemas de competitividade como o nosso ou nos posicionamo correctamente e temos uma oferta atractiva ou corremos o risco de perder clientes", vaticina.

Em Portugal

Por ser uma área nova no mundo e especialmente em Portugal, Luís Rasquilha admite que vai demorar "pelo menos um ano" para que as empresas nacionais assumam ocool huntingcomo uma "necessidade" complementar "à estratégia de comunicação ou ao plano demarketing". No entanto, até agora, a reacção das empresas a quem a AYR se tem apresentado "é positiva". João Peres Alves revela, aliás, que, se a United Media desistisse desta nova ferramenta, "provavelmente era a primeira coisa de que os clientes sentiam falta". Luís Rasquilha acredita que em Portugal o negócio docool tem espaço para progredir. Para além de adoptar "muito bem as novidades", o mercado português "é pequeno", "não está saturado", o que permite "monitorizar e identificar facilmente aquilo que está a acontecer". Até porque é mais simples "testar modelos num mercado de 10 milhões de pessoas do que num de 50 ou 200 milhões".

A primeira fornada decool huntersa actuar em Portugal está quase pronta para ir para o terreno. "No próximo ano penso que conseguiremos ter uma base de cemcool huntersportugueses, que vieram da universidade", salienta Luís Rasquilha, que é docente no Instituto Superior de Novas Profissões (INP). Neste momento, a AYR está a preparar unidades de investigação e formação emcool hunting na ETIC, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão da Guarda e no INP.


2009-09-25 10:15
Mariana Duarte, Público